Cozinha Caiçara

Cozinha Regional Caiçara

Origem

Fruto da miscigenação dos Europeus (portugueses e franceses), indígenas e escravos africanos, o povo caiçara é testemunho vivo da formação do povo brasileiro.
O termo CAIÇARA tem como origem na locução caá – içara, pelos indígenas da família lingüística tupi- guarani para denominar as estacas e galhos de espinhos colocados em torno de suas aldeias para defesa das mesmas, e também era como eles denominavam o curral feito de galhos de árvores fincados na água para cercar o peixe. Com o passar do tempo, caiçara passou a ser o nome dado às palhoças construídas nas praias para abrigar as canoas e os apetrechos dos pescadores e, mais tarde, para identificar os indivíduos e comunidades dos litorais paulista, paranaense e sul fluminense.
Os colonizadores utilizaram como “arma” para se estabelecer no Brasil a influência direta no sistema de parentesco dos grupos tupis, centrado em famílias grandes. Granjeando amizades com os chefes tribais e ligando-se as grandes famílias por meio de casamento, portugueses e franceses passaram a com numerosos grupos que os auxiliavam em seus projetos comerciais, e principalmente de colonização.
A população de mamelucos rapidamente de multiplicou, a ponto de a língua geral brasílica ser até por volta de 1785 o nheengatu, baseada no tupi padronizado pelos jesuítas em meados do século XVI.
Os caiçaras são um exemplo vivo da combinação índio/ colono, terra/mar que se estabeleceram nos costões rochosos, restingas e encostas da Mata Atlântica.
Com poucos contatos com o “mundo de fora” os caiçaras evoluíram aproveitando os recursos naturais a sua volta, que resultou numa grande intimidade com o ambiente. Povo anfíbio, entre mar e a floresta, essas pequenas comunidades tentam ainda hoje, preservar seus valores de grupo. Seus territórios praias e enseadas são de difícil acesso, por vezes protegidos por unidades de conservação. Atualmente essas terras são alvos da especulação imobiliária devido à sua beleza e excelente estado de conservação.

Pesca

Os pequenos e médios barcos a motor vieram fazer parte dessa cultura nos meados da década de 60. Antes deste período, a agricultura era a atividade primária. O homem caiçara passou de lavrador para pescador e hoje podemos dizer que a pesca é a principal atividade do homem caiçara.
O aparelhamento e as embarcações sobreviveram de processos indígenas, ao passo que, na captura predominam os elementos da cultura portuguesa.
A poita indígena é nada mais que uma âncora primitiva empregada para canoas e redes. È dela que provém expressões comuns dos caiçaras como: “Canoa poitada”; “Poitada na cama”; “Saiu da poita”, etc. O termo em tupi significa parar ou estar firme. Também é possível identificar herança na pesca provindas da imigração japonesa como é o caso do cerco.

Aparelhos de pesca

1.Destinados a ferrar o peixe: arpão, fisga, anzol e espinhel;
2.Redes de emalhar e de envolver;
3.Armadilhas fixas e flutuantes.

O homem caiçara pesca no “mar de dentro” para sua subsistência. O arrasto da tainha merece atenção especial, pois se trata de um momento de congregação da comunidade, onde todos trabalham para todos.
Há 30 anos começam a trabalhar em barcos pesqueiros. Hoje a maioria dos homens adultos é empregada em grandes barcos de sardinha, levando-os a pescar no “mar de fora” desde Cabo Frio até a divisa com Uruguai.

Agricultura

Ao contrário do que geralmente acreditamos o caiçara não pode ser entendido como cultura exclusivamente pesqueira. Por vezes em uma mesma localidade existe uma enorme diferença nos atos cotidianos entre o grupo que vive na praia e o outro que vive na serra. Algumas comunidades
“autodenominam-se de “da praia” e “do sertão”.
A agricultura caiçara serve como complemento alimentar dos pescadores e seu principal produto é a farinha da mandioca, consumida em quase todas as refeições e que desde os tempos imemoriais se trata de um substituto do pão europeu, e por isso mesmo, chamada de pão dos trópicos.
Existe ainda, uma infinidade de produtos secundários e ervas medicinais. Seus principais produtos são: milho, cana, feijão, guandu, inhame, banana, cará, abóbora e chuchu. Ovos e frutas como a pitanga o jambolão e o maracujá também fazem parte dos hábitos alimentares.

Caça

Além do peixe outros tipos de carnes vêm do quintal, galinhas, patos e porcos criados para subsistência ou ainda da mata como o porco do mato, tatu, paca, capivara, veado, lagarto, entre outros.

Extrativismo

A extração de madeira para diversos fins como lenha, construção de canoas, casas, etc, esbarra muitas vezes em proibição das leis que regem algumas Unidades de Conservação. Os caiçaras ficam assim limitados em seu próprio território. No entanto, uma das interessantes extrações é verificada na Comunidade do Aventureiro (Ilha Grande – RJ) onde os caiçaras retiram a casca do cobi (Anadenanthera colubrina) e a levam ao fogo para retirar sua resina. Esta é aplicada nas redes de pesca com a finalidade de fortalecer a malha ficando com uma tonalidade vermelha.


Ervas medicinais

Os caiçaras herdaram dos indígenas o conhecimento sobre ervas medicinais bastante vasto, sendo objeto de inúmeras pesquisas.

Artesanato

O artesanato é uma das fontes de renda para o caiçara, é feito de matérias-primas locais. São cestarias, trançados para tapetes e redes, objetos de barro, etc. Os cestos são feitos quase sempre de plantas como o imbé e a taquara. As tranças são feitas de um arbusto chamado embira de taboa ou tabua e também de palha. Da madeira vêm canoas, móveis, esculturas e alguns objetos menores, como conchas, cuias e um recipiente grande e raso chamado gamela.

Povo

Os caiçaras são originalmente um povo de religião católica, herança esta gerada pelo colono português.
Diversas festas populares, tanto religiosas, a maioria ligada a santos da Igreja católica, quanto as que acontecem fora do calendário católico, são celebradas pelas comunidades caiçaras e tomam as praças dos vilarejos.


Crendices:

A sabedoria popular caiçara aconselha que as mulheres evitem pentear seus cabelos perto dos rios para não serem transformadas em serpentes, também conhecidas como “bicho brabo”.
Varrer qualquer cisco encontrado pela casa porta afora também traz má sorte. Diz-se que a pessoa que varre pode até morrer.
Se aquela visita indesejada insiste em não ir embora é só colocar um garfo com os dentes para cima atrás da porta. Jogar sal no fogo também espanta o chato.

Expressões Cananéias

A CACO – mas a caco! Expressão que significa: mas que traste! , mas que bobo! , meio convencido, meio exibido.

ABOLETÁ – alojar-se apropriar-se. “Se aboletô de tudo pra ele“

BOLOLÕ – confusão em que se envolvem muitas pessoas.

TORRADO – bêbado embriagado.


Culinária Caiçara

Como os caiçaras são o resultado da miscigenação entre índios, portugueses e negros (em menor grau), a culinária também sofre influências desses grupos humanos. Freqüentemente os produtos como os que levam farinha são de origem indígena, mas a preparação dos pratos, sobretudo nos condimentos, percebe-se uma clara influência ibérica.

Indígenas – pratos com farinha de mandioca, naqueles com peixes ou carnes de caça.
Ibérica – cana de açúcar
Africana – banana


Produtos usados na cozinha caiçara:

Mandioca:

A mandioca, Manihot esculenta Crantz, é uma planta perene, arbustiva, pertencente à família das Euforbiáceas. A parte mais importante da planta é a raiz. Rica em fécula, utilizadas na alimentação humana e animal ou como matéria prima para diversas indústrias. Originária do continente americano, provavelmente do Brasil, a mandioca já era cultivada pelos índios, por ocasião da descoberta do país.

Beiju – origem tupi fabricado a partir de uma massa fina depositada no fundo da gamela (recipiente de madeira), onde é escorrido o caldo da mandioca. Depois de seca é peneirada, essa massa fina é cortada em pedaços e levada ao forno. Das sobras da fabricação do beiju é feita a farinha de tapioca. Na massa de fabricação do beiju pode-se acrescentar coco ralado, amendoim, coco - indaiá, brejaúva ou outros ingredientes que darão um gosto especial. A farinha de mandioca levemente fermentada e torrada é também utilizada na fabricação de bolos.

Do forneamento sai uma variedade de farinhas:

Farinha da terra ou “de mesa”: a comum, mais fina, do dia-a-dia.

Farinha d'água: mais grossa e escura feita de mandioca fermentada e um pouco azeda. Para se obter a fermentação é necessário deixar a mandioca na água e deve-se esperar até soltar a casca e ficar curtida.

Farinha manema: variedade da farinha d'água mais grossa e dura, que depois de misturada com café é um alimento considerado forte.

Farinha picica: forneada com diversos temperos especialmente com folhas de alfavaca e pimenta, é apreciada como acompanhamento de peixe.

Farinha suruí: farinha fina, mal torrada, de qualidade inferior, usada na confecção de pirão e que deve ser consumida logo.

Farinha de guerra: farinha da terra (comum) mais torrada que as outras e que, se bem guardada, conserva-se por mais tempo. Usada nas viagens ou quando o caiçara vai trabalhar na lavoura.

Farofa: feita de farinha de mandioca misturada com toucinho, carne e bastante tempero.


Pratos feitos a partir da farinha de mandioca:

Bolo de roda: feito com goma em formato de roda, muito apreciado no café da manhã.

Coruja: Tipo de pão feito com farinha de mandioca e amendoim, enrolado em folha de bananeira.

Cuscuz de mandipuva: feito com farinha fermentada, a qual se ajunta amendoim, ovos e banha de porco.

Broa de polvilho com coco ralado

Pão de aipim feito com mandioca mansa, trigo fermentado, coco ralado fresco, açúcar e ovos.

Paspalhão: espécie de beiju, feito de farinha de mandioca, temperado com sal e erva-doce e assado em folhas de bananeira substitui os pães frescos nos sítios.

Paraty: purê de fruta pão é usado a fruta verdolenga, com temperos, leite e manteiga e passada no espremedor.


Arroz:

Cuscuz de arroz: é feito com arroz lavado pilado e coado numa peneira, temperado com erva - doce, para depois ser assado na cuscuzeira.

Beiju de arroz: o arroz deve ser deixado na água de um dia para o outro, depois escorrido, socado no pilão e peneirado. Junta-se massa de mandioca crua e tempera-se com cravo, canela e sal. Depois é colocado numa folha de bananeira e levada ao forno.

Bolo de arroz: usa-se fubá de arroz, batata doce amassada, açúcar, cravo, erva – doce e banha.

Pesca:

Litoral sul: Tainha e Parati – pescados em tempo frio
Robalo, Corvina, Cação, Manjuba – pescados no verão.
Camarões são capturados para serem vendidos, raramente aparecem na cozinha caiçara.

Litoral Norte: mais abundante os peixes de pedra, como a Garoupa, o Badejo, o Sargo. Os Polvos e as Lulas são abundantes nas costeiras rochosas desse litoral. Também são pescados os peixes de pele como o Bonito, a Sororoca, o Atum, o Xaréu, e o Carapau.

A Tainha é usada tanto no Litoral norte como no sul

Pratos tradicionais:

Tainha assada

Tainha na areia: enrolada em folha de bananeira e assada num buraco na areia onde devem ser colocadas pedras aquecidas na fogueira.

Pirão

Azul Marinho

Escaldado de peixe sapreso: feito com peixe salgado e exposto ao sol somente um dia. È colocado em água fervente, escorrido e cortado em postas, em seguida é refogado com vários temperos.

Afogado: peixe cozido, em filé ou postas com muito tempero. No final do preparo o caldo é engrossado com farinha de mandioca bem torrada.

Casadinho de manjuba

Moqueca caiçara: feita com postas pequenas de peixe e temperada com ervas local, em especial alfavaca e a pimenta, misturadas com farofa e farinha de mandioca. A moqueca é então enrolada em folha de bananeira e assada no forno. Outras vezes o peixe é enrolado na folha de bananeira e enterrado no chão já aquecido por brasas.

Bolinho de peixe: feito com peixe desfiado (cação).

Pano velho: peixe refogado com molho de tomate, pimenta, cheiro verde, alfavaca e coentro.

Sopa d água: prato rápido feito com peixe seco assado direto na brasa, ao qual se ajuntam água fervente ou farinha de mandioca.

Cuscuz de peixe


Frutas e Banana

Produtos oriundos da Mata Atlântica é uma fonte importante de alimentos para os caiçaras, destacando-se a coleta de frutas (ameixas nativas, jabuticabas, cambuci, cajá-manga, cajazinho, etc.).
Das frutas são feitos doces como os da banana nanica, de mamão verde, cocadas, etc.

Nenhuma fruta se compara à importância da banana na culinária caiçara. Nanica, naniquinha, nanicão, se distinguem pelo tamanho do pé. Tem a banana vinagre, que recebeu este nome pelo seu sabor acre e é boa para comer assada, tem a casca avermelhada e é bem amarelinha por dentro. Tem a Banana da Terra, Prata, Maçã, e até uma rústica que chamam de Veiáca e que está acabando por não resistir às pragas e ao convívio com outras espécies. . Antes os pés de Banana Naniquinha eram cultivados próximos da cozinha, para estarem sempre à mão quando da chegada do peixe.


BUENO, Ana; DIEGUES, Antonio Carlos Sant'Ana; D'ALÉSSIO, Vito. Culinária caiçara : o sabor entre a serra e o mar: Caiçara cooking : flavor between montain and sea. São Paulo: Dialeto Lalin American Documentary, 2007.
Chico Júnior. Roteiros do sabor do Estado do Rio de Janeiro: turismo gastronômico. Rio de Janeiro: Senac/Rio, 2007. 207 p.

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